Maior de sua geração, Iga vale o ingresso

Foto: Corinne Dubreuil/FFT

A conquista inédita em Wimbledon não apenas recoloca Iga Swiatek no caminho das vitórias depois de um ano tão difícil, como também ratifica o nome da polonesa como a maior de sua geração. A final do último sábado, diante de Amanda Anisimova, teve um resultado atípico. Um duplo 6/0, que não acontecia na decisão de um Grand Slam há 37 anos. Quem esteve na Quadra Central presenciou algo raríssimo na centenária do história do palco mais tradicional do tênis. E que por si só, vale o ingresso.

Com seus seis títulos de Grand Slam aos 24 anos e campeã em todos os pisos – saibro, sintético e grama – Iga tem mais conquistas que as duas principais rivais somadas: Três títulos de Aryna Sabalenka e dois de Coco Gauff. No nível imediatamente abaixo, os WTA 1000, são dez troféus da polonesa, contra nove de Sabalenka e duas de Gauff. A diferença de idade é de três anos para mais ou para menos. E desde sua primeira conquista em Roland Garros em 2020, o único ano em que não venceu nenhum Grand Slam foi 2021. Mas para manter a média, venceu logo dois na temporada seguinte.

Apenas dez jogadoras na Era Aberta têm mais títulos de Grand Slam que Swiatek. Ela já deixou para trás nomes como Kim Clijsters, Martina Hingis e Maria Sharapova. E está a um título de se igualar a Justine Henin, Venus Williams e Evonne Goolagong. É a esse panteão que ela já pertence com tão pouca idade. O histórico da polonesa também inclui o Finals em 2023 e 125 semanas como número 1 do mundo, com o sétimo maior período na liderança na história da WTA, atrás apenas de Steffi Graf, Martina Navratilova, Serena Williams, Chris Evert, Martina Hingis e Monica Seles.

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Pode se dizer até mesmo que Swiatek é a maior tenista a ter aparecido desde o fim da Era Serena, que conquistou seu último Grand Slam em 2017, jogou as últimas em 2019 e encerrou sua superlativa carreira profissional no US Open de 2022. E quem foi a campeã daquele torneio, aliás? A própria Iga!

Suspensão e queda no ranking

Os últimos 12 meses foram contratados para a polonesa, a começar pela frustração da perda da medalha de ouro olímpica nos Jogos de Paris, onde era ampla favorita. Ela não escondeu a frustração e o choro após a derrota para Qinwen Zheng na semifinal, mas conseguiu se recompor no dia seguinte para vencer a disputa pela medalha de bronze.

Cerca de um mês depois, foi notificada pela Agência Internacional de Integridade do Tênis (ITIA) a respeito do resultado positivo em um exame Antidoping durante o WTA 1000 de Cincinnati. Ficou suspensa por apenas um mês, porque conseguiu comprovar rapidamente a contaminação de medicamento regulamentado e de laboratório de boa reputação – o que é muito diferente de contaminação de suplementos produzidos em farmácias de manipulação, por exemplo – e reconhece também o próprio privilégio de ter recursos apresentar uma defesa em tempo hábil e com elementos consistentes para serem aceitos por todas as entidades antidopagem. Basta ver que, diferente do que aconteceu no caso de Jannik Sinner, não houve sequer apresentação de recurso de contestação por parte do Tribunal Arbitral do Esporte, por exemplo. A defesa da jogadora foi integralmente aceita e o caso arquivado, mas ela própria afirma que a situação a colocou sob muito estresse e a abalou emocionalmente.

Mudanças de estilo e recomeço
Foto: Peter Nicholls/AELTC

Ainda havia uma lacuna a respeito do jogo. Depois de dominar o circuito por mais de dois anos, Swiatek passou a ser mais observada e estudada pelas adversárias que buscavam neutralizar seus pontos fracos. O segundo serviço gerava muita preocupação. E tenistas com golpes mais retos e estilo agressivo eram as que davam mais trabalho a ela. Perfeccionista e sempre disposta a melhorar, Iga mexeu na equipe. Por mais vitoriosa que tenha sido a parceria com Tomasz Wiktorowski, era hora de trazer um novo treinador. Wim Fissette, que já trabalhou com outras campeãs de Grand Slam (Kim Clijsters, Victoria Azarenka, Angelique Kerber, Simone Halep e Naomi Osaka) foi o escolhido. E apesar de os títulos não terem vindo logo de cara, continuou acreditando no processo.

Apesar da pouca idade, a polonesa é uma jogadora que passou por uma mudança radical de estilo. No começo da carreira e no primeiro título em Paris, usava um pouco mais de variação e curtinhas, gostava dos trick-shots como a compatriota Agnieszka Radwanska fez por anos. Engana-se quem acha que a polonesa é uma jogadora limitada ou de pouca técnica. O estilo mais variado pode ter rendido um troféu de Slam e uma vaga no top 10, com o teto na quarta posição em 2021, mas era preciso ter um jogo mais agressivo, sólido do fundo de quadra e mais bola de definição para sobreviver a um circuito dominado por jogadoras mais fortes fisicamente e agressivas. Foi para isso que Wiktorowski veio em 2022 e os resultados mostram que, no caso dela, a escolha foi acertada. E que fique bem claro que tênis não é receita de bolo e que há maneiras de vencer jogando de diferentes formas. A brilhante australiana Ashleigh Barty, antecessora da polonesa no topo do ranking, mostrou há alguns anos que era possível ser campeã à sua maneira.

Iga vale o ingresso

Quando Iga aplica um duplo 6/0 e decide uma final de Wimbledon em apenas 57 minutos, surgem comentários desmerecendo Anisimova, número 12 do mundo, e o próprio tênis feminino. Discurso repetido e ultrapassado, que já líamos e ouvíamos nos tempos em que Serena dominava o circuito. Que fique claro que as premiações são corretamente iguais para homens e mulheres e assim irão seguir. E que o trabalho de um tenista profissional, ainda mais quando falamos do mais alto nível, não se resume à duração partidas. O “custo de fabricação” de um campeão de Grand Slam, homem ou mulher, é altíssimo. E as rotinas, obrigações e compromissos são idênticos na primeira prateleira dos dois circuitos. O tempo do jogo é a variável que menos importa aqui. Isso não vai mudar e já existem planos de curto e médio para que o pagamento igualitário seja aplicado também para todos torneios combinados da ATP e WTA nos próximos anos. Qualquer posição contrária a isso, torna-se inócua.

Nada impede que aqueles jogadores que desejam ganhar ainda mais negociem individualmente os contratos com seus patrocinadores ou coletivamente junto à ATP uma maior bonificação pela assiduidade nos eventos obrigatórios e de maior exposição na TV. Preservando-se, assim, o pagamento igual por mérito esportivo. Quando se olha nas fontes de renda dos atletas mais bem pagos do mundo em levantamentos da Forbes ou da Sportico, é o extra-quadra que costuma prevalecer. Durante anos, e não por acaso, Kei Nishikori foi um tenista mais bem pago que Rafael Nadal e Novak Djokovic durante anos, mesmo sem nunca ter vencido um Grand Slam.

“Ah, mas e quem pagou o ingresso?”. Quem pagou o ingresso presenciou uma atuação histórica da melhor jogadora de nossos tempos e que pode vir a se tornar ser uma das maiores da história. A última vez que havia acontecido um duplo 6/0 em final de Slam foi em 1988. Eu nem era nascido e já tenho cabelos brancos. A última final de Wimbledon por esse placar foi em 1911. O que vimos no sábado foi como uma passagem de um cometa, um evento único na vida de qualquer fã do esporte, acontecendo diante dos nossos olhos. E que tem tanto valor quanto uma final de 5h30 como recentemente vimos em Roland Garros. Por si só, a grande atuação de Iga Swiatek valeu o ingresso. E essa é a beleza do tênis.

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William
William
7 horas atrás

Rapaz, que reportagem cirúrgica.
Imagino nos haters da polonesa lendo isso.
Iga variava mesmo no início da carreira: tanto que na final juvenil de Wimbledon que ela ganhou, aplicou várias curtinhas.
Mas o jogo dela funciona melhor no estilo agressivo de mudar de direção e colocar várias bolas nas linhas, e as adversárias ficam loucas com isso.
Quanto aos números, não tem discussão: é um fenômeno e com tão pouca idade. A meu ver, a Andreeva pode vir a quebrar esse números ou a Gauff, que ainda tem tempo.
Sabalenka já ficou pra trás faz tempo.

William
William
7 horas atrás

Quem devia ler essa reportagem são os apresentadores da ESPN que sentem uma inveja absurda da Iga, principalmente o Meligeni e a Dada.
A Iga pode ganhar 20 slams que os dois invejosos nunca vão reconhecer o tamanho dela.
Mas o Meligeni é acostumado a errar: em 2015 ele vaticinou que a carreira do Nadal estava acabada.. Sabemos o que aconteceu de lá para cá com o espanhol. Kkkkkkkkkkk

Airson Viana
Airson Viana
7 horas atrás

Meus parabéns pelo preciso comentário. Eu que sou jornalista e cronista esportivo há mais de quarenta anos, não poderia ser mais conciso. Sem dúvida, reconhecer os méritos da Iga Swiatek, grande campeã, sem desfazer da rival, é pra poucos e bons. Vqv, Iga, queremos mais apresentações de alto nível. Você pode!!!!

Ronildo
Ronildo
15 minutos atrás

Que matéria absurdamente bem escrita. Faí fazer muita gente passar vergonha, porque apareceram muitos desmerecendo o tênis feminino e até a própria Anisimova depois da final. Esqueceram totalmente a batalha que Anisimova venceu contra a número 1 do mundo na semifinal.

Jornalista de TenisBrasil e frequentador dee Challengers e Futures. Já trabalhou para CBT, Revista Tênis e redações do Terra Magazine e Gazeta Esportiva. Neste blog, fala sobre o circuito juvenil e promessas do tênis nacional e internacional.
Jornalista de TenisBrasil e frequentador dee Challengers e Futures. Já trabalhou para CBT, Revista Tênis e redações do Terra Magazine e Gazeta Esportiva. Neste blog, fala sobre o circuito juvenil e promessas do tênis nacional e internacional.
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