Presidente da USTA quer fazer o tênis mais amistoso para atletas gays

Brian Vahaly (à esquerda) e Bill Jones (Foto: Garrett Ellwood/ USTA)

Nova York (EUA) – Primeiro tenista do sexo masculino a assumir sua homossexualidade em 2017, uma década depois de se aposentar, o americano Brian Vahaly, desde novembro passado presidente do conselho e presidente da Associação de Tênis dos Estados Unidos (USTA), pretende fazer o tênis mais amistoso para atletas LGBTQIA+.

Vahaly foi um atleta de destaque de 1997 a 2001 na Universidade da Virgínia, onde foi três vezes All-American, chegou à final de simples da NCAA e se formou com dupla especialização em finanças e administração de empresas. Durante seus sete anos de carreira profissional, alcançou o 64º lugar no ranking mundial e conquistou vitórias sobre seu ídolo de infância Michael Chang e o ex-número 1 do mundo Juan Carlos Ferrero.

Ele e o companheiro Bill Jones são pais de gêmeos por meio de barriga de aluguel. Foi após a paternidade que o ex-nº 64 do mundo decidiu admitir ser gay publicamente, apesar de ser aberto sobre sua sexualidade com a família e os amigos.

“Você apenas olha para eles e pensa na vida que quer construir para eles, e suas prioridades mudam. Não se trata mais de você”, disse Vahaly, de 46 anos, à NBC News. “De repente, senti uma enorme sensação de responsabilidade não apenas pelos meus filhos, mas quase pela versão mais jovem de mim mesmo, que não tinha ninguém para quem recorrer e frequentemente se sentia solitário e isolado.”

Vahaly disse que sabia que se assumir em um podcast da Sports Illustrated provocaria uma forte reação de uma comunidade esportiva majoritariamente branca, heterossexual e conservadora. Apesar de ter recebido apoio de vários jogadores de ponta, como Roger Federer, Vahaly lembra que recebeu milhares de mensagens de ódio sobre sua jovem família.

Tendo crescido em um lar religioso e conservador em Atlanta e, posteriormente, imerso em uma cultura de vestiário onde comentários homofóbicos eram uma forma comum de “construir camaradagem”, Vahaly admitiu ter desenvolvido muita homofobia internalizada. “Naquela época, se eu pensasse em um bar gay e no que significava ser gay, e visse essas pessoas em público, eu pensava: ‘Este não sou eu. Não tenho nada em comum com esse grupo.'”

Aos 20 e poucos anos, Vahaly, com a ajuda de seu psicólogo esportivo de longa data, começou a se conformar com sua sexualidade, depois de se submeter à chamada terapia de conversão em uma igreja, onde lhe diziam repetidamente que sua atração por homens era uma espécie de defeito que poderia ser curado por Deus. Olhando para trás, Vahaly diz que desperdiçou anos tentando mudar uma parte imutável de si mesmo.

Vahaly ocupou cargos executivos seniores em empresas de capital de risco e gestão de investimentos em Washington, DC, antes de cerca de cinco anos depois de se afastar do tênis ser convidado a integrar o conselho da Usta. “Conforme eu ia descobrindo quem eu era, não senti que o tênis fosse um espaço seguro para mim, então recusei. Felizmente, o cara que estava me recrutando me conhecia muito bem e sabia como explorar meu lado competitivo”, lembrou Vahaly, rindo.

“Quando você não vê as pessoas à sua frente como um potencial modelo, é difícil saber, como atleta e homem gay, se a organização — ou um esporte em geral — se sentiria confortável com você em uma posição de liderança”, disse. “Quando assumi, fiquei muito cauteloso. A maioria dos membros do conselho era significativamente mais velha, e frequentemente conversava comigo sobre suas filhas. Eu simplesmente jogava em silêncio e me concentrava em onde eu achava que poderia causar impacto, que era realmente na área de desenvolvimento de jogadores.”

O tênis feminino historicamente teve muitas jogadoras abertamente gays, com destaque para Billie Jean King, Martina Navratilova e, mais recentemente, a australiana nascida na Rússia, Daria Kasatkina. Mas apenas um tenista masculino seguiu os passos de Vahaly: o brasileiro João Lucas Reis da Silva, que alcançou a posição 234 no mês passado, o recorde da carreira.

Embora haja agora uma maior aceitação cultural, Vahaly destacou que ainda existem vários fatores que impedem os jogadores do sexo masculino de quererem se assumir, incluindo as potenciais consequências financeiras dos patrocinadores e o fato de que o circuito ainda viaja para países onde ser gay não é legal nem aceito.

“A nova geração pensa em inclusão e em ser ela mesma de forma muito diferente da minha geração, então, tenho esperança de que a homofobia comece a desaparecer um pouco, que as pessoas em nossa comunidade se sintam aceitas no esporte”, disse.

Agora, como dirigente do esporte, Vahaly ainda enfrenta alguma homofobia. “Ainda há lugares em que omitem o fato de que sou gay ou pai. Mas, às vezes, gritar aos quatro ventos suas crenças ou ser muito firme e direto não é a abordagem correta. As pessoas não estão acostumadas a ver uma família gay, mas acho que humanizar as pessoas em nossa comunidade é o que nos impulsiona”, acrescentou. “Não estou tentando impor nada a ninguém. Estou simplesmente tentando mostrar como e por que não somos tão diferentes. Acho que isso abre espaço para que as pessoas se abram à diversidade e à inclusão.”

Apesar do atual clima político, Vahaly disse que não está tão focado “no que está acontecendo ao nosso redor” e mais focado em como pode usar o US Open para ampliar o trabalho de várias organizações LGBTQIA+ como The Trevor Project, Athlete Ally, You Can Play e a Gay and Lesbian Tennis Alliance. O Grand Slam americano sediará seu quinto Open Pride em 28 de agosto.

“Penso no que posso fazer e no que posso controlar”, disse Vahaly. O que posso fazer é ser honesto comigo mesmo e participar de entrevistas como esta para continuar a mostrar e demonstrar ao mundo a diversidade que existe no nosso esporte e que eles devem se sentir bem-vindos. Quero que as pessoas saibam e vejam que este é um lugar seguro para elas.

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Paulo A.
Paulo A.
16 horas atrás

Iniciativa mais do que necessária!

JClaudio
JClaudio
11 horas atrás

Ótimo depoimento…
Quando é dito que o tênis ainda é jogado em países que criminalizam a opção de vida de alguém, deveríamos ficar chocados, afinal estamos em 2025 (apesar que até 1968, era crime ser gay na Inglaterra).
Vahaly lembrou sobre o público do tênis (branco, heterosexual e conservador), igual por aqui, apesar da resistência sobre a realidade.
O absurdo da tentativa da conversão via igreja, dizendo que Deus iria “curar” o “defeito” (acontece com frequência em nossas igrejas nada é feito ou divulgado, normalizamos com oração).
Ser gay é para forte, não é para fracos.

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