Por Daniel Stein Rohr, jornalista e tenista amador
Porto Alegre/RS
Fazia calor na quadra central do Challenger de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, naquela tarde de março de 2024.
Mas a temperatura escaldante não desanimou o público, que disputava cada palmo das arquibancadas provisórias de metal, montadas especialmente para o que era considerado o maior evento esportivo do ano no estado.
Em quadra, um paraguaio de 19 anos enfrentava um brasileiro, cabeça de chave número 4, por uma vaga na grande final do torneio.
Favorito, mais experiente, melhor ranqueado e com o apoio da torcida.
Um cenário perfeito para a consagração. Certo?
Talvez não.
Ainda no meio do primeiro set, o paraguaio acerta uma bela paralela na direita, o que provoca aplausos efusivos de uma espectadora na casa dos 30 anos. A animação confunde o rapaz sentado ao lado dela, que interpela: “Tem que apoiar o brasileiro!”
A resposta dela é curta, mas carrega um histórico que o rapaz desconhece. “Depois do que eu vi de manhã, vou torcer sempre pro adversário dele”, explica, com referência ao jogo das quartas de final, disputado mais cedo.
À medida que o jogo transcorre, o rapaz começa a entender o desgosto da mulher sentada ao seu lado. Ou, para usar uma definição popular entre os jovens, do “ranço”.
Sobrinho de um ex-tenista brasileiro, o jogador “da casa” resmunga entre os pontos, faz caretas e reclama da “sorte” do adversário. Culpa a quadra, a fita, o árbitro de linha e a raquete. Quando o público tenta levantar sua moral, olha com desdém, como se ninguém estivesse em condições de torcer a seu favor. Demonstra, a cada resmungo em voz alta, que não vê a hora de voltar para o hotel.
Felizmente, o público não precisou pagar ingresso para assistir ao show às avessas, que ganha contornos de horror no set decisivo. Quebrado logo no primeiro game de serviço, o paulista aparenta total esgotamento físico e emocional. É verdade que a rodada é dupla para ele, mas também é verdade que ele contou com um WO na segunda rodada, e portanto está jogando quatro dias após a estreia.
Impassível ao atormentado adversário no outro lado da quadra, o paraguaio número 251 do mundo conduz o set sem sustos, ganha 27 de 38 pontos e aplica um pneu no cabeça de chave brasileiro em 30 minutos. Quando o árbitro de cadeira decreta “game, set, match”, já há poucas testemunhas para ver o melancólico cumprimento na rede.
Pelo relato, você pode alegar algum tipo de exagero da torcida. E talvez até tenha certa razão. De qualquer forma, impressiona o tamanho da proeza de alguém que, jogando em casa, consegue colocar o público contra si próprio. É, convenhamos, um trabalho de especialista.
Mas essa não é a pior notícia.
A pior notícia é que esse não foi um caso isolado.
Quem frequenta os torneios de segunda linha (challengers) ou terceira linha (ITFs) no Brasil, certamente já viu fenômeno parecido.
É um comportamento tão recorrente, que parece ter virado padrão.
Não é restrito a um jogo, a um torneio ou a um atleta. Há exceções, mas os indícios apontam que estamos diante de um problema geracional.
Seria leviano de minha parte tentar elencar razões para esse comportamento. Entendo que aqui é necessária autocrítica de quem está diretamente envolvido nos processos. Mas algo me diz que esse comportamento está na raiz do hiato de resultados dos últimos anos.
Pode não ser a causa, mas é sintoma.
E isso fica ainda mais evidente quando analisamos a atitude dos nossos hermanos. Me parece claro que, mais do que treinadores, parceiros de treino ou processos diferentes, o que nossos tenistas buscam ao recorrer à Argentina como centro de treinamentos é, acima de tudo, amadurecimento.
Dito tudo isso, o tênis tem pressa, como mostrou a Copa Davis. Enquanto uma geração amadurece tardiamente, nossos olhares se voltam para a próxima geração – com a esperança de que a convivência com nossos jovens mimados não provoque estragos irreversíveis.
Daniel .é um problema grave. E pelo jeito ele já é profissional. E ainda está com este problema…um caso gravíssimo.
Muito bom o texto, pura realidade dessa geracao nossa que nao vai a lugar nenhum, chega ser um desrespeito ver esse cara citado jogar…
Texto irretocável
Parabéns
Um texto que faz refletir… e isso já é o mais importante. Tenho 55 anos e parei imediatamente para me preocupar quando ouvi que pertenço à geração (talvez a única que existirá) que obedeceu aos pais e aos filhos. Eehhhh… tá feia a coisa. Mesmo assim, não generalizaria o problema como fez o autor.
Parabéns ao autor, pela clareza e honestidade.
Excelente texto. Não há como discordar de você. O jogador citado é, de fato, muito mal educado e tem péssimo comportamento em quadra.
Finalmente um texto dizendo a verdade do tennis brasileiro sem medo d ofender a geração mimimi
Muito bom o texto. Estava pensando exatamente isso estes dias. Vejo diversos jogos onde os brasileiros demonstram mais recursos técnicos, mas perdem para adversários inferiores tecnicamente pois desistem facilmente após os primeiros erros, desanimam do jogo de uma forma supreendente, não se entregam como um atleta profissional. Até para nós que queremos torcer fica difícil continuar assistindo. Aliás, em resumo, pra mim falta profissionalismo. Temos tenistas, mas temos poucos atletas de tênis. E o circuito é feito de atletas, não de amadores. O Brasil precisa trabalhar em um centro de formação nacional, onde os melhores tenistas juvenis se juntariam, teriam preparo psicológico, os treinadores deveriam fazer intercâmbios com as melhores escolas mundiais ( argentina, americana, italiana, francesa, espanhola), ter parcerias com essas principais federações para trocas de experiências e camping de treinamentos. Se não investir na formação de base de jogadores e treinadores, continuaremos esperando as exceções, como Guga, Bellucci, Bia e agora o Fonseca.
Muito bom texto e ótima escolha dos editores do tenis Brasil. Borou a mão numa ferida que precisamos
Pelo jeito, muitos brasileiros adotaram o estilo rançoso de NICK KYRGIOS de ser tenista…
Mas o nick está milionário. Os dois falados aqui acho que ainda não. O wild como top 100 está fazendo seu pé de meia
Mas qual é o nome desse tenista?
Já devia ter saído do jogo faz tempo
E ainda vai dizer q a culpa é da pressão.
É difícil saber exatamente de onde vem a fraqueza dessa geração, nem falo de tênis, mas de tudo ao redor. Eles parecem ter sido super protegidos demais, tendo de graça tudo que os pais batalharam. Daí resiliência e humildade passa longe…
O Thiago Wild encabeça essa lista. Mais mimado que ele, impossível.
Ótima matéria, parabéns, Meligeni e Heide são dois exemplos de tenistas mimizentos e preguiçosos
Concordo. O Meligeni é muito mais que o Heide. Não chega a ser um “Minizento” completo como o Wild, mas é muito Minizento.
Eu não consigo torcer pelo Wild, vi de perto esse rapaz em quadra é realmente dá asco.
Meligeni e Heide não estão inscritos para o Challenger de Guaiaquil dia 28, dei uma olhada aqui e vi que Coria,Dellien,Comezana não só estão inscritos como jogaram todos os torneios da gira sul-americana pós USOPEN, mais ai eu tô falando de tenistas profissionais né
Ótimo texto, a falta de preparo psicológico dos tenistas brasileiros é absurda,a maioria pipoca nos momentos decisivos das partidas, incluindo os 2 mimados que todos nós conhecemos muito bem
Infelizmente, é isso mesmo. Esses rapazes precisam entender que o trabalho e a dedicação são fundamentais para o sucesso no tennis. Sobre o tenista em questão, ele precisa entender que sobrenome não joga.
O tenis é um esporte que exige que a família do atleta tenha uma boa condição financeira. Por outros lado, essa boa condição financeira gera “atletas” pouco motivados ou confortáveis com o que tem de futuro. É um paradoxo: Para seguir no tenis precisa de dinheiro, mas ter dinheiro gera conformismo.
Acompanhei de perto esse processo com meu filho e vi dezenas de jovens tenistas se enquadrarem nesse cenário. Meu filho mesmo foi assim. Segundo ano de 16 já jogando ITFs furando qualys e tal. Primeiro ano de 18 jogando chaves principais de ITFs, jogando chave principal de Brasil Juniors Cup e Banana Bowl. Quando estava pronto para fazer um segundo ano de 18 para ou ir bem para os EUA ou tentar o profissional, ele espanou, Já estava com namorada, vendo a “galera” indo para festas e demais curtições e ele treinando manha e tarde, mãos calejadas, eventuais contusões, estudando a distância, tendo de estudar mais a noite, etc.
Resultado: era melhor sair do tenis e ficar no “padrão classe média”: fazer faculdade no Brasil, tendo todo o conforto de casa, carro, festas, etc.
É difícil no Brasil um jovem classe média desenvolver o “querer” necessário para ser um atleta.
Isso é uma realidade no esporte brasileiro em geral, não só o tênis. Até no futebol, as equipes que hoje tem uma base bem sucedida investem muitos recursos em educação e preparo psicológico.
O tio desse tenista viu o jogo? Conversou com ele?
Ótimo esse assunto vir a tona. Extremamente realista!
Caramba, eu achava o Felipe tão simpático nos jogos que vi
Fiquei perplexo com este texto. Desconfiava que alguns tenistas brasileiros eram mimados, mas não neste nível. O pessoal tem citado o Wild, mas pelos resultados que ele está tendo, vencendo até mesmo Medvedev, creio que esteja bem focado na carreira.
É preciso muito cuidado ao examinar a questão. Creio que há mais vieses em torno do assunto do que aqueles aqui citados. Duvido que um menino talentoso, cujos país têm condições de vida precária, e que tenha começado no tênis através de algum projeto social não veja no esporte uma forma de virada de mesa para ele e para a família.
O pano de fundo, além do talento natural de determinadas crianças ou de um intenso trabalho para forjar tenistas com domínio de técnicas essenciais, me parece ser a paixão acima de tudo. Para atingir um nível compatível com as exigências de circuitos extremamente competitivos é preciso muita disciplina, vontade férrea, treinamentos incessantes, desenvolvimento físico e muita força mental para superar frustrações e para lidar com sucessos.
A coisa complica, e muito, se os meninos ou meninas não tiverem a menor atração pela modalidade esportiva e só viraram praticantes em virtude da vontade de pais, que, não raramente, neles projetam suas expectativas e sonhos.
Mesmo para quem pratica o tênis de forma amadora não será fácil entender o que se passa na cabeça de atletas profissionais. São eles que lidam cotidianamente com a pressão por ascender no ranking para sobreviverem num meio onde há falta de infraestrutura e de organização, escassez de torneios domésticos e tantos outros problemas que estão longe de existir em outros países.
Portanto, é preciso cuidado com as generalizações. A crítica aqui exposta pelo Daniel tem endereço certo e pode muito bem se aplicar a determinados tenistas, mas não me parece ser essa a realidade do tênis brasileiro. Pelo visto, tem muita gente dando mais do que recebe.