Andy Murray não poderia terminar sua heroica batalha de outra forma: dono do melhor lob que já vi no circuito, realizou dois seguidos em cima do grandalhão Oscar Otte, um jogador que surpreendeu pela disposição ofensiva apesar de suas evidentes limitações, e assim o escocês manteve sua sina de jamais perder antes da terceira rodada desde a estreia em 2005.
Murray, claro, está ainda longe do que pode realmente fazer numa quadra de grama, mas ele sabe achar atalhos e tira toda a energia possível da enlouquecedora torcida. São evidentes seus altos e baixos, a falta de pernas ou de confiança para meter mais a cara na rede, e aí o excessivo padrão defensivo acaba aflorando. De qualquer forma, há uma chance bem considerável de passar por Denis Shapovalov, canhoto com histórico pobre no piso, desde que consiga se recuperar fisicamente.
No começo do dia, Novak Djokovic deu mais um show. Foi tão superior que até parecia que Kevin Anderson não era um especialista na grama, com vice em Wimbledon. O sérvio tem exibido nestes dois jogos as qualidades mais especiais de quem se aventura na superfície: um saque devastador e devoluções milimétricas. Se mantiver o padrão, será praticamente impossível ganhar dele. Enfrenta agora Denis Kudla, que é um batalhador de bolas retas, e deve depois reencontrar Gael Monfils. O ‘freguês’ francês só beliscou oitavas em Wimbledon uma vez.
No outro quadrante, Andrey Rublev me causou espanto pelo tamanho do domínio sobre Lloyd Harris e é favorito natural contra Fabio Fognini e depois diante de quem passar entre Diego Schwartzman e Marton Fucsovics.
Já o setor de Murray tem ainda outra esperança local, Daniel Evans, que passou bem na estreia por Feli López e hoje ganhou com autoridade de Dusan Lajovic. Mas não será fácil cruzar com Sebastian Korda. Não ficaria surpreso aliás se acontecesse um duelo todo norte-americano, já que Frances Tiafoe fez outra ótima exibição diante de Vasek Pospisil e pode muito bem prevalecer em cima do pouco confiável Karen Khachanov.
Kyrgios lidera queda de cabeças
Nada menos que 27 jogos desta quarta-feira ainda foram válidos pela primeira rodada e entre eles alguns resultados relevantes. O destaque é claro foi Nick Kyrgios. Após cinco meses sem competir e apenas dois torneios disputados desde março do ano passado, fez um jogo de alto nível e tirou o embalado canhoto Ugo Humbert num emocionante quinto set, por 9/7. É um excepcional jogador sobre grama, com capacidade de alternar velocidades e efeitos, além do saque fulminante e enorme habilidade na rede. Tem chance real de passar por Gianluca Mager e dar trabalho a Felix Aliassime, que fez um jogo redondo e não deu qualquer chance a Thiago Monteiro.
Também caíram Pablo Carreño, Casper Ruud e John Isner entre os cabeças de chave. Semifinalista de 2017 e quartas em 2019, Sam Querrey nem de longe pode ser chamado de surpresa e venceu bem os três sets contra Carreño,. É perigoso. Com ‘apenas’ 1,70m e um tênis totalmente de contragolpe, o canhoto Yoshihito Nishioka fez 3 aces contra os 36 do gigante Isner, de 2,08m, e só ganhou 18% dos pontos como devolvedor, porém o japonês aproveitou dois de quatro break-points e ainda levou um tiebreak.
Notável a vitória em sets diretos de Kei Nishikori, ótima recuperação da esperança local Cameron Norrie e nova frustração para Jo-Wilfrid Tsonga, que também parece muito perto do adeus.E Matteo Berrettini está muito a fim de jogo. Todos os vencedores, mesmo os que fizeram cinco sets, têm de voltar à quadra nesta quinta-feira.
Campeãs de Slam dão adeus
Duas jovens e uma veterana vencedoras de Grand Slam já deram adeus ao torneio, mas foram surpresas pequenas em se tratando de grama.
Sofia Kenin caiu cedo pelo quarto Slam consecutivo diante da também americana Madison Brengle, repetindo a segunda rodada de Melbourne. Venus Williams também se foi, mas Ons Jabeur atravessa bom momento e varia muito bem seus golpes. Por fim Bianca Andreescu nem passou da estreia, com 34 erros e um placar arrasador imposto por Alizé Cornet.
Aryna Sabalenka, Iga Swiatek, Karolina Pliskova e Garbiñe Muguruza já estão na terceira rodada. A cabeça 2 precisou de virada e de paciência com a torcida, a polonesa foi muito firme e Muguruza já ganhou em Wimbledon e pode achar o caminho de sua recuperação.
Aliás, a grama também é ótimo lugar para Pliskova recuperar sua temporada instável, mas estou gostando mesmo é de Sloane Stephens. Ela não saca muito, nem bate tão forte, mas é uma jogadora taticamente muito aplicada e está num setor bem interessante da chave.
O feminino também teve 23 jogos ainda de primeira rodada, que marcaram estreia difícil de Elina Svitolina, quedas de Belinda Bencic e Anett Kontaveit e vitórias de Vika Azarenka e Anastasia Pavlyuchenkova.
Sustos e preocupação
Depois das contusões sérias de Serena Williams e Adrian Mannarino, que não conseguiram seguir em seus jogos na Central, o piso escorregadio causou várias outros sustos nesta quarta-feira. Djokovic, tal qual acontecera na estreia, foi ao chão algumas vezes e não se mostrou nada feliz. Isner e Kyrgios também sofreram quedas feias, que felizmente não causaram danos maiores, e o próprio Murray perdeu o equilíbrio e imediatamente colocou a mão na problemática virilha, um sinal de alerta temeroso.
Questionado sobre o problema, o All England Club colocou a culpa no excesso de umidade da atmosfera no período em que o piso foi cultivado. “Tivemos a maior umidade em uma década e assim o teto das quadras precisou ser fechado, o que isso influenciou no assentamento”, afirmou, jurando que a preparação das quadras foi exatamente igual a todos os outros anos. “Conforme os jogos acontecerem, a quadra ficará firme”. Será?