Enfim, o que todo mundo suspeitava aconteceu. O governo australiano cedeu ao que poderia ser um movimento negativo a sua já um tanto abalada popularidade e concedeu ‘permissão especial’ para Novak Djokovic disputar o Australian Open, dentro de duas semanas, em Melbourne.
A notícia é muito boa para o tênis em si. O Grand Slam da Oceania cresce de importância a cada temporada, tanto na estrutura como na competitividade, e seria muito ruim para todo mundo que o melhor tenista do mundo e o recordista de troféus, em plena forma para chegar ao 10º título, ficasse de fora.
Mas ao mesmo tempo é um péssimo exemplo para aqueles que defendem a saúde pública, como parece ser o caso do governo australiano. Afinal, Nole é um ferrenho integrante do grupo antivacina, bateu o pé desde o início e jamais admitiu ter se vacinado. Ao contrário, brigou nos bastidores para obter a tal brecha sanitária. É uma exceção perigosa, que coloca as autoridades australianas naquele grupo do ‘jeitinho’.
Não se pode a grosso modo crucificar Djokovic. Ele é contra a vacinação e fez muito bem sua parte, procurando todos os recursos para entrar na Austrália sem obedecer a regra geral, calcado ao que tudo indica em relatórios e estudos de especialistas sobre imunização. Marcou território, certamente agradou a sua torcida pela firmeza de decisão e será o grande favorito para não apenas estender sua soberania no torneio e no ranking, mas principalmente para se isolar como recordista de troféus de Grand Slam.
Os fins neste caso justificaram os meios, ainda que possa abalar sua imagem perante uma outra parte expressiva do público, que considere sua postura egoísta. Rafael Nadal, aliás, usou exatamente esse adjetivo quando se referiu às pessoas que não se vacinam. Grigor Dimitrov, há poucas horas, se posicionou a favor de que todos seguissem a norma estabelecida. Como reagirá o circuito, já que 90% da ATP e 86% da WTA estão completamente vacinados?
O derrotado acima de tudo é o governo australiano, que insistiu desde o início que seria rígido e austero nessa decisão. Chegou a citar diretamente a situação de Djokovic. Vale lembrar que a onda de infecção triplicou no leste australiano desde o Natal e o estado de Victoria multiplicou por oito o número de contagiados.
Restou aos promotores soltar um lacônico comunicado citando que ‘médicos independentes’ liberaram o tenista, mas sabe-se que as normas previamente divulgadas pelas autoridades sanitárias sobre ‘permissão especial’ não se encaixam na questão do sérvio: inflamação cardíaca ou infecção por coronavírus muito recentes, efeito secundário grave após contrair a doença, problemas de saúde mental que coloquem em risco sua vida ou profissional de saúde que precise entrar no país por interesse nacional.
A polêmica portanto seguirá nos bastidores, nos vestiários e na sala de entrevistas. Djokovic dificilmente vai se livrar de cobrança, de perguntas e quem sabe de protestos. O quanto ele conseguirá administrar isso a cada vez que entrar em quadra será seu outro desafio.