Assim como os grandes tenistas, aqueles que geralmente merecem títulos, Stefanos Tsitsipas viu uma chance, agarrou com unhas e dentes e não desperdiçou. Numa batalha de 4h05 que exigiu o máximo de sua frieza e capacidade técnica, o grego de 22 anos se tornou apenas o terceiro a virar em cima de Rafael Nadal depois que o espanhol fez 2 sets a 0. E com um desempenho desse quilate, tentará pela terceira vez decidir um Grand Slam.
Foi um jogo épico de vários capítulos, bem definidos. No primeiro deles, Nadal jogou num nível assombroso, tomando a iniciativa nos dois primeiros sets e sufocando Tsitsipas o tempo inteiro. A segunda parte da história veio num terceiro set totalmente equilibrado e com mínimas falhas dos sacadores. Nadal continuava a trabalhar muito bem com o saque, mas o grego conseguiu enfim calibrar o forehand, elemento crucial na evolução que viria a seguir.
O tiebreak mudou tudo. Stef errou uma bola boba logo de cara e Nadal teve um smash absurdamente fácil para 2-0. E errou. E errou de novo, este outro um pouco mais difícil lá do fundo de quadra. Agressivo e concentrado, Tsitsipas agradeceu e iniciou a reação. De forma espantosa, sem gritarias ou comemoração exagerada. Era um bom sinal.
A terceira parte do jogo viu Nadal cada vez mais lento, o que o fazia errar bolas tolas, mas salvando-se com o saque e sua inigualável capacidade de lutar e encontrar soluções, como subidas inesperadas à rede. Porém do outro lado da quadra estava agora um adversário que se mexia esplendidamente, sólido nos golpes, sóbrio na atitude, ciente de que havia surgido uma oportunidade de ouro.
O espanhol merece todos os créditos pelo esforço enorme que fez para se manter vivo no quinto set, mas era evidente que faltavam pernas, algo muito semelhante ao que aconteceu no terceiro set diante de Daniil Medvedev no Finals de pouco meses atrás.
Quem diria, Nadal perdeu no físico. Não tinha mais forças para manter a maior parte das trocas, errava bolas no meio da rede e muitas vezes nem tentou a defesa. Mas lutou como pôde e ainda quase arrancou uma quebra para levar ao match-tiebreak diante da natural tensão que o oponente sentiu frente à façanha gigantesca que tinha diante de si.
O desafio agora é Medvedev
Stef está assim pela terceira vez numa semi de Slam e tenta evitar a frustração de Melbourne-2019 e de Roland Garros do ano passado. A missão é outra vez muito difícil, já que o russo Daniil Medvedev está bem mais descansado e ganhou quatro dos cinco confrontos já feitos entre eles.
‘Urso’ também está em sua terceira semi de Slam – mas tem o vice do US Open de 2019 – e aumentou sua incrível série invicta para 19 jogos ao superar com certa folga o amigo e compatriota Andrey Rublev. Ele aliás busca o quarto título seguido, que se somaria ao Masters de Paris, ao Finals de Londres e à ATP Cup. Com toda justiça, assumirá o terceiro posto do ranking na segunda-feira no lugar de Dominic Thiem e pode até superar Nadal, caso conquiste o título no domingo.
Medvedev bateu Rublev sem perder set pela quinta vez. Sua solidez diante do jogo de risco do conterrâneo faz toda a diferença, ainda que Rublev tenha sentido cãibras para complicar ainda mais. Fato curioso, esta foi apenas a segunda vez que Medvedev derrotou um top 10 em Slam, repetindo a vitória sobre Stan Wawrinka em Wimbledon de 2017.
O estranho adeus de Barty
A segunda vaga na final feminina do Australian Open ficará com uma tenista que está hoje fora do top 20. A líder do ranking Ashleigh Barty sofreu uma atípica virada diante da tcheca Karolina Muchova, 27ª colocada, e Jennifer Brady ganhou o duro duelo norte-americano com Jessica Pegula.
Muchova, que também reagiu de um péssimo início contra Karolina Pliskova, esteve perto de levar um ‘pneu’ de Barty no set inicial. Pediu atendimento para um mal estar e daí em diante apostou num tênis sólido. A australiana saiu completamente do eixo, passou a errar tudo e perdeu o ímpeto agressivo. A Austrália continuará sem uma campeã. A última foi em 1978.
De qualidade muito superior, o duelo americano foi de reviravoltas. Cada uma dominou um set e no terceiro Pegula saiu com quebra, mas Brady foi muito mais eficiente daí em diante e disparou no placar.
O jogo desta madrugada promete ser equilibrado. Se Brady já esteve na semi do US Open do ano passado e está no 21º posto do ranking, Muchova levou a melhor no único duelo entre elas, em Praga-2017.
Público volta para alegrar semifinais
Com o retorno autorizado de público às arquibancadas, a arena Rod Laver terá quase 8 mil espectadores nesta quinta-feira para ver jogos bem interessantes.
Com ares de final antecipada, Naomi Osaka reencontra Serena Williams com a vantagem de ser 16 anos mais jovem e ter vencido dois dos três duelos entre elas. Osaka nunca perdeu uma semi de Grand Slam nas três vezes que chegou lá e Serena busca igualar o recorde de 34 finais desse nível de Chris Evert. Em seguida, acontece a inesperada semi entre Brady e Muchova.
Às 5h30, o líder do ranking Novak Djokovic entra com favoritismo absoluto diante do russo Aslan Karatsev, que está 113 posições atrás do ranking e nunca havia disputado um Slam na carreira, ainda que tenha 27 anos. O sérvio jamais perdeu uma semi no Melbourne Park. Nenhum quali ou debutante em Slam decidiu um título na Era Aberta.
Recorde garantido para Djokovic
A ATP confirmou: com a queda de Nadal, é certo que Djokovic permanecerá na liderança do ranking até o dia 8 de março e portanto atingirá as 311 semanas como número 1, superando a incrível marca de Roger Federer. Que feito!
E mais
– As outras duas viradas que Nadal sofreu após abrir 2 sets a 0 foram em Miami-2005 para Federer e no US Open-2015 frente a Fognini. Sua marca de qualquer forma é assombrosa: 243-3.
– Tsitsipas já tinha obtido uma reação desse naipe, mas foi frente ao também espanhol Jaume Munar em Roland Garros do ano passado.
– O tiebreak perdido no terceiro set, que abriria caminho para a reação do grego, impediu Nadal de igualar a marca de 36 sets seguidos vencidos em Slam, que assim permanece com Federer.
– Medvedev se torna o quinto russo a alcançar as semifinais em Melbourne, se juntando a Aslan Karatsev. Apenas Kafelnikov (1999) e Safin (2005) foram campeões.
– Soares e Murray confirmaram sobre Arevalo/Middlekoop e têm grande desafio na semi diante dos atuais campeões, Ram e Salisbury. Se chegar ao bi em Melbourne, o mineiro grudará nos colombianos e ficará a 180 pontos da liderança do ranking.
– Sabalenka e Mertens estão na final de duplas contra Krejcikova e Sianiakova. Se forem campeãs, assumirão o número 1 do ranking de duplas por apenas 5 pontos sobre Hsieh.